AO DEUS DESCONHECIDO


Por Teol. Leônidas Almeida

 

        O sermão*proferido pelo Ap.Paulo em Atenas, uma das principais cidades gregas e berço da democracia, considerada influente pela sua arte e filosofia e também um importante centro de estudos. Como nos dias de hoje os cidadãos de Atenas gostavam de gastar tempo buscando novidades, novas experiências, novas fórmulas existenciais, novos modelos e também novos Deuses.

        Ocorre que quando os ouvidos estão mais atentos as novidades,  assuntos de maior importância perdem sua relevância. Então passamos a viver numa atmosfera de vazio e superficialidades, de moda em moda, de show em show, de celebridades em celebridades, sabedores de tudo e não compreendendo nada, restando apenas um vazio na alma.

        Em relação a sua filosofia dividida entre os epicureus, que criam que a felicidade e o prazer eram o sumo bem da vida, e os estoicos - que, sendo panteístas, criam numa ética caracterizada pela qualidade moral e responsabilidade pessoal. Em linha geral podemos entender que os estoicos buscavam a autossuficiência como bem supremo, enquanto os epicureus buscavam o prazer. Ainda hoje podemos encontrar a influência deste pensamento no modo de vida contemporâneo, e até mesmo a fusão de ambos num mesmo grupo, seja por meio de partidos políticos, denominação religiosa, filosófica, grupo sociais, conversas de bar, etc.

        Paulo se revoltou ao perceber a cegueira espiritual dos atenienses em relação a suas diversas concepções de DEUS, pois no pensamento Paulino Deus é transcendente e imanente ao mesmo tempo, ou seja o Deus que foi revelado no Antigo Testamento é o mesmo Deus que se fez imanente na pessoa de Jesus Cristo.

        Por conseguinte este Deus não se diluiu no mundo, conforme o pensamento panteísta dos estoicos, o mundo não se torna Deus, pois Deus se manifestou como Senhor neste mundo, que ele tanto amou na pessoa de Jesus Cristo conforme já havia ensinado o evangelista João: "Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3.16). Por isso não teria como Paulo definir Deus e nem compreendê-lo por meio de categorias antológicas proposta pelos filósofos gregos.

        A indignação experimentada por Paulo nos adverte a postura que devemos ter diante de determinado fato e situação em que nos encontramos. Portanto no exemplo do apóstolo temos duas escolhas a saber: Ficamos em nossa zona de conforto assistindo pela telinha os acontecimentos da vida pública e social ou nos indignamos e saímos para fazer algo.

        Lembro o testemunho do Rev. David Wilkerson ao ver notícias de jornais a respeito de várias gangs se matando pela luta de poder no guetos de Nova York dos anos 60/70. Então o Rev. D Wilkerson saiu de sua confortável vida de Pastor numa cidade do interior e foi para aquele local a fim de realizar alguma coisa que pudesse ajudar aquelas pessoas. Posteriormente o Rev. Wilkerson fundou um dos maiores centros de recuperação de viciados em drogas do mundo.

        Paulo, como um autêntico discípulo de Cristo, era um cristão das praças públicas, procurou de toda forma estabelecer comunicação com os ouvintes pelo debate franco e respeitoso, ao invés da imposição direta de suas convicções, sem contudo deixá-las de expor em toda sua plenitude, pois tinha consciência que sua missão em Atenas era fazer conhecido deles esse Deus desconhecido.

        Paulo entende que a santidade da religiosidade do mosteiro, quando não compreendido seu significado, pode nos separar das pessoas e impede nosso testemunho, enquanto a santidade do fermento vai rumo as vilas e praças na busca do outro. "Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo" (Jo 17.18).

        Quem anuncia o evangelho deve estar preparado para ser taxado de ignorante, desprezível, maluco, importador de culturas destrutivas, tagarela, etc. Paulo estava disposto a ser taxado de tudo isto e mais ainda, pois seu objetivo não era simplesmente agradar a plateia, pois entendia o significado da "verdade que liberta" (Jo 8.32).

        A presença de Paulo fora marcante mesmo no meio de um tipo de intelectualismo cínico, sabia que a semente da palavra de Deus quando semeada no coração humano pode dar seus frutos apesar do antagonismo humano. Quando Deus abrir uma oportunidade para que você compartilhe o evangelho não fique intimidado, ou pensando nos resultados de curto prazo que isto possa trazer, avance e semeie a palavra, sabendo que é o próprio Deus que trará os seus frutos no seu devido tempo. Faço aqui apenas uma observação: O discurso nunca deve estar separado da vida, pois a hipocrisia escandaliza e fecha o coração das pessoas para a palavra de Deus.

        Para os Atenienses, o Deus desconhecido era adorado, porém não tinham conhecimento e comunhão com este Deus. Tinham apenas uma vaga ideia respeito da possibilidade de sua existência. Muitos de nós também somos assim, acreditamos que exista um Deus, com maior ou menor grau de grandeza e entendimento, porém não procuramos conhecê-lo em sua essência como pessoa, bem como sua revelação e sua vontade para nossas vidas.

        Paulo ressalta que este Deus pode ser achado por aqueles que mesmo tateando, ou seja com uma visão vaga a respeito deste Deus, pois não está longe de nós, pois aquele que o busca certamente o encontrará, tendo como certeza uma promessa do próprio Deus revelada nas Escrituras dando conta que a todos que o buscam o encontrarão. "E buscar-me-eis, e me achareis, quando me buscardes com todo o vosso coração. Conheçamos o Senhor; esforcemo-nos por conhecê-lo. Tão certo como nasce o sol, ele aparecerá; virá para nós como as chuvas de inverno, como as chuvas de primavera que regam a terra. Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora" (Jr 29.13, Os 6.3, Jo 6.37). 

         Lembro que certa vez um amigo me perguntou: Leo você realmente acredita que Deus exista? Eu respondi: Você não deve me fazer este tipo de pergunta, porque não dizer isto diretamente a ele no silêncio e na intimidade do seu quarto com fé e humildade? Então continuei: A minha experiência de fé é única e pessoal**, posso até compartilhar com você, porém continuará a ser minha experiência de fé e não a sua, então continue sua busca e verá por você mesmo. ** Leia neste link - "Busca visitação e graça": http://grupocaminhopaz.blogspot.com.br/2011/10/busca-visitacao-e-graca.html

        Em razão disto nunca tentei convencer ninguém a respeito da existência ou não de Deus, evito debates com ateus, pois se a pessoa já fez sua escolha pela incredulidade, não tem como levá-los a experiência com o numinoso, pois para abrir a porta do encontro com Deus é necessário possuir a chave da fé. "Ora, sem fé é impossível agradar-lhe; porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que recompensa aqueles que o buscam" (Hb11.6). 

        A preleção de Paulo inicia no apelo da obra divina da criação e da providência. Quem é este Deus Desconhecido? Deus criador do cosmos, não habita em santuário feito pelos homens, assim "Deus é espírito, e é necessário que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade" (Jo 4.24). Não tem como restringir Deus a determinado credo ou confissão religiosa pois ele esta acima das organizações erguidas pelos homens.

        Paulo continua afirmando que Deus não é servido pelos homens, revela um Deus doador da graça, na medida em que não a há nada que podemos dar a Deus, pois ele nos doou todas as coisas graciosamente, não há como fazer barganha, a única coisa que podemos fazer para realizar as obras de Deus é crer naquele que ele enviou, a saber seu filho Jesus.

        Neste sentido o Teólogo Karl BARTH ressalta a distância entre Deus e o mundo, pois Deus é totalmente livre e soberano, assim enfatiza o amor de Deus ao lado da liberdade absoluta de Deus, onde a relação do homem com Deus é vertical, ou seja, o ser humano somente pode reconhecer a salvação na medida em que a revelação ocorre a partir do próprio Deus. Barth diz: "Justamente por isto há graça somente no reflexo da Ressurreição, como presente do Cristo, o qual faz a ligação entre Deus e o ser humano, ao mesmo tempo em que a rasga, separando-a".  Sobre esta graça divina o cantor Bono Vox (U2) na música - Grace - assim a descreve: "Graça ela assume a culpa, ela cobre a vergonha, remove a mancha, um pensamento que mudou o mundo, encontra bondade em tudo, ela viaja fora do Karma".

        Então Paulo ao ser referir sobre a ressurreição do corpo é violentamente criticado pelos ouvintes, tendo em vista que a Ressurreição do corpo esta incondicionada a qualquer tipo de forma de autopurificação, pois a Graça de Deus em Cristo perdoa o pecador. Desde então o tema da ressurreição do corpo continua sendo uma pedra de tropeço, trazendo um divisor de águas nas diversas correntes filosóficas e religiosas.

        Podemos concluir que a mensagem anunciada por Paulo consistia primeiramente na realidade da existência de um Deus único,  bondoso, gracioso, doador da vida, e que requer de nós o arrependimento dos nossos pecados. Quanto a este mundo de injustiças esta reservado a ele um dia de Juízo, um acerto de contas com o próprio Deus, por meio daquele que ele ressuscitou dentre os mortos a saber Jesus o qual será este juiz para todos.
 
Ouça esta linda canção citada no texto - Grace - U2
 

 

Texto Original (*) - Sermão de Paulo em Atenas.

"Enquanto estava esperando Silas e Timóteo em Atenas, Paulo ficou revoltado ao ver a cidade tão cheia de ídolos. Ele ia para a sinagoga e ali falava com os judeus e com os não-judeus convertidos ao Judaísmo. E todos os dias, na praça pública, ele falava com as pessoas que se encontravam ali.Alguns professores epicureus e alguns estóicos discutiam com ele e perguntavam: —O que é que esse ignorante está querendo dizer? Outros comentavam: —Parece que ele está falando de deuses estrangeiros. Diziam isso porque Paulo estava anunciando Jesus e a ressurreição. Então eles o levaram a uma reunião da Câmara Municipal e disseram: —Gostaríamos de saber que novo ensinamento é esse que você está trazendo para nós. Pois você diz algumas coisas que nos parecem esquisitas, e nós gostaríamos de saber o que elas querem dizer. É que todos os moradores de Atenas e os estrangeiros que viviam ali gostavam de passar o tempo contando e ouvindo as últimas novidades. Então Paulo ficou de pé diante deles, na reunião da Câmara Municipal, e disse: —Atenienses! Vejo que em todas as coisas vocês são muito religiosos. De fato, quando eu estava andando pela cidade e olhava os lugares onde vocês adoram os seus deuses, encontrei um altar em que está escrito: “AO DEUS DESCONHECIDO”. Pois esse Deus que vocês adoram sem conhecer é justamente aquele que eu estou anunciando a vocês.  —Deus, que fez o mundo e tudo o que nele existe, é o Senhor do céu e da terra e não mora em templos feitos por seres humanos. E também não precisa que façam nada por ele, pois é ele mesmo quem dá a todos vida, respiração e tudo mais. De um só homem ele criou todas as raças humanas para viverem na terra. Antes de criar os povos, Deus marcou para eles os lugares onde iriam morar e quanto tempo ficariam lá. Ele fez isso para que todos pudessem procurá-lo e talvez encontrá-lo, embora ele não esteja longe de cada um de nós. Porque, como alguém disse: “Nele vivemos, nos movemos e existimos. ” E alguns dos poetas de vocês disseram: “Nós também somos filhos dele.E, já que somos filhos dele, não devemos pensar que Deus é parecido com um ídolo de ouro, de prata ou de pedra, feito pela arte e habilidade das pessoas.No passado Deus não levou em conta essa ignorância. Mas agora ele manda que todas as pessoas, em todos os lugares, se arrependam dos seus pecados. Pois ele marcou o dia em que vai julgar o mundo com justiça, por meio de um homem que escolheu. E deu prova disso a todos quando ressuscitou esse homem. Quando ouviram Paulo falar a respeito de ressurreição, alguns zombaram dele, mas outros disseram: —Em outra ocasião queremos ouvir você falar sobre este assunto. Então Paulo foi embora dali. Mas algumas pessoas creram e se juntaram a ele. Entre essas estavam Dionísio, que era membro da Câmara Municipal, uma mulher chamada Dâmaris e mais outras pessoas". AT 17.16-34 NTLH

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