O NATAL DAS SAUDADES
Por Teol. Leo Almeida
E JÓ CONTINUOU sua
defesa: Ah, que
saudade do meu passado, do tempo em que Deus me protegia! Que
saudade do tempo em que Deus, com a sua luz, iluminava o meu caminho e eu
andava em segurança em meio às trevas! Que saudade do tempo em que eu era forte e
cheio de saúde, quando Deus era meu amigo e abençoava minha família! Quem me
dera voltar ao tempo em que Deus estava do meu lado e eu tinha a companhia
alegre de meus filhos, o
tempo em que meu caminho era feito só de sucesso, o tempo em que eu era capaz
de conseguir azeite de uma pedreira! Jó 29.1-6
Já se sentiu como
Jó, saudade dos tempos que foram, saudade dos tempos em que tudo parecia dar
certo, saudade dos amigos que pareciam ser inabaláveis e sinceros, saudade de
ter aquela saúde de ferro, saudade do sucesso, saudade daqueles cultos
abençoados, saudade e mais saudade.
Talvez agora
esteja passando por momento de escassez e solidão. Sonhos frustrados, promessas perdidas no tempo, momentos de
loucura, chega mesmo até aborrecer o presente, sem nenhuma expectativa para o
futuro. Enfim só vê alegria pelo retrovisor, o que já fui, o que perdi, o que
se foi, o que fizera.
Segundo o filósofo
Viktor E. Frankl, só consegue suportar um período de tortura e desgraça, quem busca ver as boas imagens e recordações do passado e projetá-las para o
futuro, mesmo que o presente seja terrível e insuportável. Então fixar o olhar
no presente caótico e apenas compará-lo com as alegrias do passado, tornará seu
caminho insustentável, pois estará a passos largos da derrota total iminente. A
vida necessita de sentidos, precisamos encontrar razões naquilo que somos,
fazemos e por aqueles que amamos.
Viktor E Frankl, a
partir de sua própria experiência vivida nos campos de concentração nazistas,
afirmou: Quem não consegue acreditar no "futuro - seu futuro - esta
perdido no campo de concentração. Sem esperança no futuro, tal pessoa perde o
apoio espiritual, sucumbe interiormente e decai física e psiquicamente".
O Deus que te abençoou
no passado é o Deus do presente e também o mesmo Deus que te abençoará no
futuro. O próprio Jó, apesar de toda dor e sofrimento, tinha a convicção a
respeito da soberania de Deus em todos momentos e situações adversas, pois
assim disse:"Bem sei eu que tudo podes, e que
nenhum dos teus propósitos pode ser impedido". Jó 42.1-2
Neste contexto de
desesperança até a saudade relatada por Jó passa a ser consumidora e
destrutiva. Para Frankl existe "uma saudade tão ardente, que só resta uma
sensação: a de se consumir. Além disso há o nojo. O nojo de toda a fealdade que
o cerca, interior e exterior. Deste modo a pessoa aos poucos, vai morrendo
interiormente".
O teólogo R Bootz
afirma que as experiências antigas emergem com tanta força no presente, que
imaginamos vivenciar algo, quando na verdade, vivenciamos sentimentos
ancestrais e retrógrados Assim a carga emocional retroage com tanta força que
forma um arbusto que nos rodeia e nos sufoca com suas determinações.
As diversas perdas na vida de Jó o
levaram a questionar o verdadeiro sentido da vida. Apesar de sua honestidade e sinceridade diante de Deus
e dos homens, suas conquistas o levaram a superestimar a vida do presente
século, que certamente resultou numa perda do sentido da transcendência, pois o
desejo e a ansiedade de uma realização plena nesta vida gerou um distanciamento
de Deus, pois apesar de ouvir seus ensinos não compartilhava mais a intimidade
de uma vida dependente da graça Divina.
Este distanciamento de Jó em relação a
Deus é confessado por ele mesmo neste diálogo: "O Senhor perguntou quem foi o
ignorante que tentou negar a sua sabedoria e justiça; fui eu, Senhor. Falei de
coisas que eu não entendia, coisas que eu não conhecia pois eram maravilhosas
demais para mim. Somente agora eu conheço o Senhor de verdade! Antes eu
só o conhecia de ouvir falar". Jó 42.3,5.
Aqui esta o grande
perigo daqueles que anunciam a Teologia da Prosperidade como ponto fundamental de
sustentação espiritual na vida do filho de Deus e ainda aqueles que propagam o
evangelho mutante do oba oba, do marketing pessoal. A estes alerto: CUIDADO!
que a queda é grande e profunda, em particular, para aqueles que foram chamados
e se desviaram do caminho, pois o caminho de volta é bastante dolorido, pode
ser um caminho de muitas perdas.
Neste ponto o
Teólogo S Kierkegaard enfatiza sobre a necessidade de nos avaliarmos
continuamente respeito da verdade do evangelho em nós, e não estarmos a procura
de uma novidade travestida de evangelho: "no fundo, preciso ver claramente
em mim mesmo o que devo fazer e não o que devo conhecer, salvo na medida em que
o conhecimento sempre precede ação. Trata-se de compreender o meu destino de
ver o que Deus quer propriamente que eu faça, isto é, de encontrar uma verdade
que seja verdade para mim, de encontrar a ideia pela qual quero viver e
morrer".
Depois de muitos
porquês sem respostas racionais de Deus em relação ao seu servo Jó, este passou
a entender a vida como um presente de Deus que apenas nos cabe administrar por
um período e em seguida entrega-la de volta a Deus. Então Jó declarou: Nu sai
do ventre de minha mãe, e nu voltarei; o Senhor o deu, e o Senhor o tomou;
bendito seja o nome do Senhor! Jó 1.21
Então se você tem
saudades dos Natais que se foram, procure visualizar estes momentos e retome a
esperança futura, perceba as pessoas que te amam e oram por você. Segundo o
teólogo P Tillich devemos entender a fé em seu caráter paradoxal, isto
significa manter a postura corajosa diante da Presença Espiritual, esta fé tem
um conteúdo antecipativo, ou seja, "traz a existência coisas que ainda não
existem", pois alimenta a esperança na criatividade plenificante do
Espírito divino. "Ora, a fé é a certeza daquilo que
esperamos e a prova das coisas que não vemos. Hb 11:1
Ouça esta canção "SINCERAMENTE" uma das boas antigas, agora revisitada por KIM.
Notas
bibliográficas
BOOTZ,
Everton R. Aconselhamento pastoral e espiritualidade - São Leopoldo/EST: SINODAL, 2008.
FRANKL,
Viktor E. Em busca de sentido - São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: Vozes, 25ª
Ed. 2008
KIERKEGAARD,
Soren. As Obras do Amor; Petrópolis: Vozes, 2005
TILLICH,
Paul. Teologia Sistemática - São Leopoldo: Sinodal, 5ª Ed. 2008
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